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Santa Catarina registra mais de três feminicídios por mês em 2018

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Maria Aparecida de Pinho Fagundes, 50 anos, morreu com um golpe de canivete desferido pelo ex-marido em Santo Amaro da Imperatriz. Maria Francisca de Oliveira, 47, levou um tiro e foi queimada dentro da casa em que vivia com o companheiro em Florianópolis. Andréia Araújo, 28, estava grávida de três meses quando foi assassinada a soco pelo marido em Jaraguá do Sul.

Três mulheres que foram vítimas de feminicídio em Santa Catarina em 2018 e representam um extrato das 43 vítimas de assassinato no Estado em razão de gênero ou por violência doméstica no ano passado, uma média de 3,5 ocorrências a cada 30 dias.

O dado, embora menor que em 2017, é inquietante, principalmente se apreciado pela ótica de que muitos outros assassinatos de mulheres em SC não foram classificados como feminicídio, mas sim como homicídio doloso contra mulher, tipificação mais branda no caso de sentença condenatória dos autores.

Tanto é que, em novembro do ano passado, durante a 12ª Semana pela Paz em Casa, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), a desembargadora Salete Sommariva afirmou que SC é “um dos Estados que mais matam mulheres no Brasil”.

Número de estupros deu um salto

Se por um lado, o número de feminicídios em 2018 diminuiu na comparação com 2017 – de 50 para 43 –, todos os outros índices de violência contra a mulher aumentaram no Estado nos 12 meses do ano passado. Os dados foram obtidos pela reportagem com a delegada Patrícia Zimmermann D’Avila, coordenadora das Delegacias de Proteção a Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (Dpcamis) no Estado, e o psicólogo da Polícia Civil Antônio Carlos José Britto, que atua junto a mulheres e crianças vítimas de violência.

Entre os crimes em elevação contra as mulheres, estão transgressões cruéis, violentas e traumáticas como estupros consumados, que saltaram de 2.958 registros de ocorrência para 3.948 entre um ano e outro. O número representa um aumento de 25% no registro de estupros em delegacias do Estado.

E esse crescimento, pelo segundo ano consecutivo, deve colocar Santa Catarina no topo do ranking nacional de registros da ocorrência com os números referentes ao ano passado. No ano anterior, em 2017, de acordo com os dados do Anuário Brasileiro da Segurança Pública, SC foi o segundo Estado do Brasil com mais denúncias de estupros registradas.

Para a delegada Patrícia Zimmermann D’Avila, o crescimento dos índices de violência contra a mulher em SC está relacionado também ao fortalecimento das redes de enfrentamento e a facilidade no acesso aos canais de denúncia.

Patrícia expõe que, como o trabalho de prevenção vem sendo feito na ponta, a comunicação de muitos crimes que seriam subnotificados é feita pela mulher e registrada pela polícia, o que traz um cenário mais claro da realidade.

— O único crime que não admite subnotificação é o feminicídio, que é considerado índice real. Trabalhamos duro para conscientizar as vítimas a procurarem ajuda no primeiro ato de violência. Não podemos deixar o ciclo da violência evoluir e terminar em feminicídio — avalia a delegada.

Mais tentativas de morte e de estupro, além de lesões corporais

As lesões corporais dolosas, quando mulheres apanham como aconteceu com a advogada Ana Cristina Rossi, de 26 anos, que teve o nariz quebrado por um soco do ex-namorado em dezembro, também subiram em SC. De 20.860 casos em 2017, o Estado registrou 21.147 ocorrências em 2018.

A delegada Patrícia Zimmermann lembra que, ao chegar nesse estágio de agressão, como aconteceu com Ana no sul da Ilha, a mulher já está correndo riscos há muito tempo. Ela alerta que as vítimas devem procurar a polícia para denunciar o agressor desde a primeira ameaça feita contra a mulher.

— Faz um registro da ocorrência, deixa a delegacia trabalhar. Vamos fazer análise de risco para ver se há risco de vida para aquela pessoa. Vamos avaliar o grau de agressividade dessa pessoa, vamos procurar o histórico antecedente dele, porque há uma escala de riscos que vai aumentando cada vez mais.

A delegada destaca que no caso da advogada de Florianópolis que teve o nariz quebrado estavam claros episódios de controle e ciúme possessivo por parte do ex-namorado, como o acesso às senhas da mulher em redes sociais que o acusado tinha. Nas palavras de Patrícia, o homem “roubou dela a individualidade”, e duas pessoas para dividirem a vida precisam “conviver”.

As tentativas de estupro, ranking no qual o Estado já liderou o registro de notificações em 2016 e 2017, saltaram de 594 casos para 689, aumento de 14%. Crescimento ainda maior aconteceu com as tentativas de feminicídio, que dos 160 registros de 2017 saltaram para 280 em 2018.

Feminicídios por municípios (casos de morte consumados em 2018)

Apiúna, Barra Velha, Biguaçu, Blumenau, Camboriú, Canoinhas, Chapecó, Concórdia, Garopaba, Gaspar, Herval D’Oeste, Itajaí, Joinville, Lages, Mafra, Navegantes, Nova Veneza, Palhoça, Rio do Sul, Santo Amaro da Imperatriz, São Bento do Sul, São Francisco do Sul, São João Batista, Videira e Xanxerê – 1

Blumenau, Imbituba, Itapiranga, Jaraguá do Sul, Laguna, Nova Itaberaba e Tubarão – 2

Florianópolis – 4

Florianópolis foi a cidade com mais assassinatos de mulheres

Os 43 feminicídios registrados em Santa Catarina em 2018 aconteceram em 33 cidades. Florianópolis concentrou a maior parte deles, com quatro casos. O número é o maior registrado na Capital nos últimos quatro anos e dobrou na comparação com 2017, quando aconteceram duas mortes de mulheres em razão de gênero ou violência doméstica. Em 2015, foram dois casos. No ano seguinte, três.

A região metropolitana de Florianópolis também teve feminicídios em Biguaçu (1), Palhoça (1), São João Batista (1) e Santo Amaro da Imperatriz (1), totalizando oito casos. Fora os que acabaram classificados pela autoridade policial ou Ministério Público de Santa Catarina como homicídio doloso contra mulher.

Nesses casos, que somavam 66 mortes violentas no Estado até setembro de 2018, a investigação em fase inicial não comprovou que a motivação dos assassinatos estivesse ligada à questão de gênero ou violência doméstica. Muitas vezes, porém, elementos que indiquem essa característica podem ser constatados ao longo da apuração ou na tramitação já em fase processual.

O promotor Alexandre Carrinho Muniz, titular da 8ª Promotoria de Palhoça, explica que uma diretriz do Ministério da Justiça de 2016 determina que toda morte violenta de mulher deve-se partir da premissa que foi um feminicídio. Ou seja, é necessário esgotar-se todas as investigações para, caso contrário, partir para a hipótese de um homicídio contra mulher não motivado pelo fato de ela ser mulher.

— Mas, digamos que um delegado concluiu o inquérito e tipificou como homicídio contra mulher, que não era feminicídio. Quando o inquérito chegar para o promotor, ele que vai decidir se é feminicídio ou não. Se ele observar que é caso de femincídio, oferece a denúncia por feminicídio. O promotor que vai decidir — destaca Carrinho Muniz.

Maioria das mortes foi executada a facadas

Uma informação que chama atenção nos casos de feminicídios em Santa Catarina é a forma como ocorrem os assassinatos. Na maioria dos casos, as vítimas são mortas com armas brancas, exemplos de facas e canivetes, revela a delegada Patrícia Zimmermann, coordenadora das Delegacias de Proteção a Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (Dpcamis) no Estado.

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Segundo ela, isso expõe que os episódios de violência que resultam em morte acontecem em momentos de explosão e raiva de homens, em boa parte dos casos companheiros da mulher – inclusive com filhos.

— O instrumento mais utilizado é a faca. E uma faca você tem dentro de casa, está ali perto. O autor não precisa ter uma arma de fogo. Os feminicídios praticados com emprego de arma de fogo são raros, porque é o momento da raiva, o momento da briga — observa a delegada.

O mais triste nesses casos, aponta Patrícia, é que em muitos feminicídios há um efeito colateral que atinge as crianças, já que a mãe é assassinada e o pai, preso.

— O impacto dessa violência na vida dessas crianças, desses filhos, é muito grande, pois elas perdem o norte total — conclui Patrícia.

Equipe Gazeta
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