Dando continuidade à série de entrevistas com veteranos do 3º Batalhão de Polícia Militar (3º BPM), o quinto entrevistado é o sargento da reserva não remunerada Pedro Penteado do Prado. O seu ingresso na Polícia Militar ocorreu em 07/02/1969, após ter servido o Exército Brasileiro.
Filho de Dorival Anjos do Prado e Francelina Penteado do Prado, Pedro nasceu no município de Lebon Régis/SC. Ali passou parte de sua infância, onde seu pai exerceu as funções de inspetor de quarteirão e de delegado de polícia. Isso se devia ao prestígio moral de seu pai, que cumpria o requisito principal exigido na época: a conduta ilibada. No período, essa função era de nomeação do governador do estado. O pai também exerceu a função de delegado de polícia no município de Santa Cecília/SC.
Desde criança, Pedro gostava das letras e das artes, no entanto, as dificuldades comuns à época o impediam de seguir seus estudos. Em 1968, ao completar dezoito anos, residia em Curitibanos/SC. Foi convocado para servir o Exército no 2º Batalhão Rodoviário, em Lages/SC. “No Exército concluí meus estudos. Nos nove meses em que servi, tive a oportunidade de apenas estudar, o que aproveitei ao máximo. Fiz curso de cabo e fui promovido poucos meses antes da baixa”.
Na época, era difícil conseguir emprego. Seu pai, por já ter familiaridade com o meio policial, incentivou-o a ingressar na Polícia Militar. Em Curitibanos, havia a 3ª Companhia de Polícia pertencente ao 3ºBPM (3ªCia/3ºBPM). “No início de 1969 ingressei na 3ª Cia, já como cabo PM, a graduação que obtive no EB, porém tirei poucos serviços nessa graduação”.
Isso porque, pouco tempo depois, passou no concurso para sargento. “Logo que ingressei nas fileiras da PM em Curitibanos, no início de 1969, abriram as inscrições para o Curso de Sargentos em Canoinhas, no 3º BPM. Candidatei-me e logo aconteceu a seleção dos candidatos. Fiquei feliz quando soube do resultado, pois fui aprovado para frequentar o Curso.”
Descreve a sensação pela qual passou. Era um jovem interiorano e sua vida, até então, havia girado em torno das cidades de Lebon Régis, Santa Cecília, Curitibanos e Lages (no Exército). Para prestar o concurso, de Curitibanos, veio de ônibus. “A viagem de ônibus levava uma eternidade. Precisava pernoitar em Porto União para tomar outro ônibus para o destino: 3º BPM”.
A rodoviária de Canoinhas ficava na rua Vidal Ramos, nas proximidades da atual farmácia São João. “O ônibus passou em frente ao batalhão e trafegou por algumas ruas centrais da cidade. Ao descer na rodoviária, eu estava perdido e caminhei em direção à ponte do rio Canoinhas, o rumo das casas de tolerância, até ser alertado que o batalhão ficava do outro lado”, relembra sorrindo.
Durante a viagem, outros policiais aumentavam o grupo que prestaria o concurso. “De Porto União para Canoinhas já estávamos em um pequeno pelotão de policiais que vinham de diversas regiões do planalto e até do oeste. Lembro que tomamos um táxi – veja, da praça Lauro Müller ao Batalhão! E o taxista era o soldado Valter, da PM, e o outro era o policial Querrubes Cabral Mendes. Era comum às praças da época buscarem um reforço na remuneração, pois os salários não eram os melhores do mundo… E os automóveis eram BEM ANTIGOS: De Soto, Studbaker e outros mais que não recordo as marcas”!
Rememorou um fato engraçado. Os policiais que participavam da seleção tinham alojamento franqueado, mas precisavam custear sua alimentação fora do quartel. Na hora do almoço, entre uma etapa e outra do concurso, a turma foi dispensada e seguiu no sentido da área central de Canoinhas. O dinheiro era escasso e as dificuldades, grandes. Em frente à Sociedade Beneficente Operária (SBO), um dos colegas disse: “Será que ali não fornecem comida grátis? Afinal, é sociedade beneficente…”, o que ocasionou riso aos demais. Mais tarde, já durante o curso de formação, a anedota virou uma charge de autoria de Pedro, que é artista de grande talento.
“Fiquei feliz quando soube do resultado, pois fui aprovado para o Curso. Iniciamos em março de 1969 e o concluímos ‘nove duros’ meses depois. A formatura ocorreu no início de 1970, quando, então, recebi o uniforme de 3º Sargento PM, o qual enverguei com muito orgulho. Tive a honra de me tornar um dos sargentos MAIS JOVENS da PM catarinense, pois não havia ainda completado 20 anos e já fui graduado.”
Guarda o convite de sua formatura, que contém a relação completa de seus colegas: Alberto Antônio Fransozi, Arestides dos Santos, Benvindo Bueno de Oliveira, Célio Alves de Deus, Celso Francisco Ribeiro, Conrado Frederico Fransfeld, Edú Straube, Fredolino Rodrigues de Oliveira, Fúlvio Pereira, Jauntley de Carvalho, João SIlvério Antocheski, Lori José Pscevozniki, Lourival Francisco de Souza, Lourival Gomes, Luiz Agostinho Lotti, Natálio Fernandes, Olides Ferreira, Pedro Penteado do Prado, Pedro Secundino Perego, Rubens Graciliano de Araújo, Swami Otto Straube, Valdemar Gonçalves Batista, Valdemiro Polomanei, Valdir Baldessari.
Uma vez formados, os sargentos eram distribuídos por todo o estado. “No 3º BPM ficamos apenas o Rubens e eu, na época, pois só havia duas vagas e os primeiros colocados no curso tinham o privilégio de escolher as vagas. Rubens foi o 2º colocado e eu o 3º, o 1º colocado foi o Jauntley e escolheu outro município. Outra coisa que muito me orgulha é que dentre os formados sargentos, alguns deles cursaram a Academia de Polícia e chegaram a Oficiais PM. Isso realmente me honra, pois nossa turma era diferenciada! Dentre outros, posso citar Valdir Baldessari e Pedro Secundino Perego. Com o passar do tempo, muitos retornaram à sede do 3ºBPM “como aconteceu com o Edu, o Conrado Frederico Dransfeld e o Antocheski.”
Os sargentos tinham uma formação bastante complexa, sendo preparados, inclusive, para exercerem a função de delegado de polícia, algo bastante comum no período. “Nós chegamos a ter aulas práticas sobre inquérito policial na delegacia de Três Barras, Major Vieira e de Papanduva. Diversos dos meus colegas exerceram essa função”. Um exemplo foi Lori José Pscevozniki que foi delegado de polícia em Abelardo Luz/SC. Em sua homenagem, o município possui uma rua com seu nome”.
“Outra lembrança que tenho comigo foi o trabalho de socialização e entrosamento que nossa turma desenvolveu na cidade de Canoinhas. Atrevo-me a dizer que a Polícia Militar não era muito bem-vista na sociedade. Havia uma grande quantidade de policiais mais velhos que pouco ou quase nada se entrosavam no meio social. Em nossa turma havia alguns mais jovens que se arriscavam a namorar com as meninas da elite canoinhense, na maior parte das vezes a contragosto dos pais. Mas os pais acabavam sendo vencidos! Tínhamos um Professor de Educação Física formidável: o Aspirante Nelson Coelho, o qual fazia maravilhas com os alunos sargentos. Por muitas vezes nosso curso fazia apresentações de ginástica calistênica básica misturada a apresentações circenses, tal como acrobacias e shows de mágicas e embevecimento para as plateias previamente convidadas, como escolas de ensino fundamental e médio, e também, principalmente para as Normalistas do Sagrado Coração de Jesus, para as quais nós nos desmanchávamos para aparecer… E geralmente atingíamos o objetivo! Isso fez mudar muito o conceito da PM perante a sociedade.”
As festas juninas organizadas pelo batalhão também são parte de suas memórias. “Outra coisa que também fez a sociedade mudar o conceito sobre a PM, foram as festas juninas que promovíamos no Batalhão. Eram festas sadias e seguras, claro, pois se desenvolviam dentro do quadro do Batalhão, sendo frequentadas por centenas, quiçá milhares de pessoas enquanto duraram as festividades. Mais um fato que ajudou muito a modificar o pensamento da sociedade sobre a PM, foi a vinda, em 1970, de onze Aspirantes para o 3º BPM, todos jovens, na casa dos vinte anos de idade. Dentre eles havia pelo menos dois que eram filhos da cidade: César José Rosa e Francisco de Assis Vitovski. Logo nos tornamos amigos, pois éramos todos da mesma idade. Isso fez com que novamente os olhos do povo canoinhense vissem que nem todos os policiais eram carrancudos e antipáticos como o era a velha guarda da PM”.
Pedro permaneceu na instituição até o ano de 1971, quando pediu baixa para exercer funções civis. Possuidor de excepcional inteligência, foi aprovado em diversos concursos públicos e teve formação acadêmica diversificada. Foi bancário, arquiteto, professor, além de empreendedor. Várias gerações de canoinhenses tiveram o privilégio de tê-lo como professor em sua formação, especialmente, nas disciplinas de artes, física e química. Além disso, é autor de diversos livros, dos quais se destacam: “Química Mágica a Experimentação”, “Mácula”, “Contestado: o povo que fique com a história”. É também membro da Academia de Letras do Brasil em Canoinhas e artista plástico primoroso.
Sobre o período em que serviu no 3º BPM enaltece: “Devo dizer que, mesmo com o exíguo tempo que permaneci nas fileiras da PM, esse período marcou-me profundamente, pois, além de angariar uma infinita gama de amigos dentro do quadro de militares do 3º BPM, sempre cumpri com os deveres de Policial Militar. Hoje, são poucos os parceiros que ainda estão entre nós. Destaco com orgulho, por exemplo, o Subtenente Rubens Graciliano de Araújo, Edu Straube e João Silvério Antocheski, que ainda residem na cidade e região.”
Guardou diversas recordações de seu tempo como policial militar: fotografias, coleção de charges (de sua autoria), convite de formatura, fardamento. “Mesmo após minha baixa, continuei guardando com carinho meu uniforme de 3º Sgt PM, tal como outros documentos de meus tempos nessa Briosa Corporação.” Recentemente, doou sua túnica de 3º sargento ao batalhão, a qual se encontra exposta no memorial do quartel.
Ao relembrar de sua história e de sua turma, conclui: “Posso assegurar que todos aqueles Sargentos deram tudo de si para honrar a envergadura desse uniforme da PM catarinense. Como a história passada é muito maior que a história futura, temo que, ao me for, minhas filhas provavelmente não darão ao meu uniforme o mesmo valor que eu dou, e por esse motivo eu o doo ao 3º BPM, para que fique registrado aí o meu agradecimento por ter sido militar dessa casa que tanto prezo. Recentemente fui encontrado nas redes sociais por um dos colegas de curso, hoje Tenente Coronel Valdir Baldessari. Fiquei muito feliz com esse reencontro! Volto a assegurar: tenho imenso orgulho de ter pertencido às fileiras da Briosa Corporação e por ter feito o Curso de Sargentos aqui, no 3º BPM de Canoinhas!”
Por capitão Diego Gudas