Nas últimas três ou quatro décadas, principalmente, são significativos os avanços em termos de gestão dos resíduos sólidos nas cidades brasileiras. Isso ocorre pela conscientização ambiental, pressão popular e iniciativas de órgãos de fiscalização, como o Ministério Público, mas, sobretudo, em razão da Lei 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
Se anteriormente a esse período, normalmente, nenhum tipo de dejeto era separado e tratado adequadamente, tendo como único destino os lixões (tecnicamente denominados de vazadouros) ou os aterros sanitários, atualmente dispõe-se, em muitos municípios, de campanhas e programas de Educação Ambiental, serviços dos catadores e reciclagem de materiais recicláveis, dentre outros, o que contribuiu significativamente na conscientização ambiental e na melhoria das relações com o ambiente.
Outro aspecto positivo foi a crescente e maior sensibilização das pessoas em relação aos problemas ambientais do Planeta e à responsabilidade de cada um no cuidado do seu entorno, na perspectiva de deixá-lo mais saudável e seguro. Infelizmente, no entanto, ainda estamos longe de atingir os níveis necessários de reciclagem de materiais, como os executados por alguns países, tais como a Suécia e a Dinamarca, dentre outros.
Um dos aspectos mais críticos na gestão dos resíduos urbanos em geral é o tratamento do material orgânico. O problema inicia-se nas residências, onde ocorre a mistura dos materiais orgânicos, como os restos da preparação dos alimentos, com os materiais sintéticos ou inorgânicos de pequeno porte, o que inviabiliza os processos de reciclagem.
O mesmo ocorre com a grande quantidade de material orgânico proveniente da manutenção de jardins e hortas, que muitas vezes é mesclado com objetos plásticos, metálicos, dentre outros. Em segundo lugar, é a forma de acondicionamento do rejeito orgânico para a coleta nas vias públicas; o que falta é um mobiliário urbano eficiente para seu depósito até seu recolhimento, sem que cause incômodos relacionados a odores e proliferação de insetos, e logo, o processo final de transformação para sua posterior reutilização.
Em alguns países, já é executada a coleta seletiva de resíduos orgânicos mediante pontos de depósito nas vias públicas. São contêineres de cor marrom, que contêm um cartaz ilustrativo e explicativo sobre quais são os materiais admitidos e como estes deverão ser acondicionados, cuidadosamente, em sacos plásticos biodegradáveis.
O recolhimento do material é feito diariamente e de maneira organizada por caminhões equipados para tal finalidade. Além deste serviço de coleta, algumas cidades possuem lixeiras complementares para os resíduos orgânicos em espaços públicos de grande afluência.
A importância do tratamento correto para o descarte deste tipo de resíduo está relacionada ao fato de que, mesmo havendo a falta de dados ou números exatos, acredita-se que mais da metade dos dejetos produzidos nas cidades é de origem orgânica, o que dá uma dimensão deste problema na gestão municipal dos resíduos sólidos urbanos.
Assim como os demais materiais inorgânicos reciclados, os rejeitos orgânicos podem proporcionar benefícios ambientais e econômicos. Seu controle e aproveitamento reduzem os efeitos contaminantes no solo, nas águas superficiais e subterrâneas e na atmosfera. Uma das soluções é a técnica de compostagem em larga escala, para a produção de fertilizantes, os quais poderão ser utilizados na agricultura, em hortas e parques públicos, dentre outros.
Do mesmo modo, podem ser utilizados em composteiras de uso doméstico, como ótima alternativa para a obtenção de material fértil e de baixo custo para as hortas e jardins residenciais. Ainda, outro uso potencial do material orgânico das cidades é o energético, associado ao aproveitamento do gás, principalmente o metano, proveniente do processo de decomposição dos rejeitos, produzido nos biodigestores.
Essa é mais uma das alternativas ou Tecnologias Sociais de Gestão Ambiental (TSGA) de baixo custo, capaz de oferecer fornecimento de energia para residências ou comunidades.
Em suma, os resíduos orgânicos urbanos devidamente processados são boas formas de obtenção de energia e de materiais para a fertilização do solo para fins agrícolas e de jardinagem. A gestão integral, acoplada à reciclagem de outros materiais não orgânicos, pode reduzir significativamente o impacto ambiental dos depósitos de lixo ou lixões ainda existentes ou dos aterros sanitários.
Cabe, neste sentido, principalmente aos gestores públicos municipais, incluir em suas políticas públicas ambientais o tratamento dos resíduos orgânicos, lembrando, sempre, que ao reduzir, reutilizar e reciclar os materiais, estamos contribuindo para o atendimento de um dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos pela Organização das Nações Unidas (ONU), neste caso, o Objetivo 11, que pretende tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis.
João Ricardo Licnerski é arquiteto e urbanista e doutorando no Programa de Doutorado em Desenvolvimento Regional na Universidade do Contestado (UNC).
Jairo Marchesan é doutor em Geografia e docente no Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Desenvolvimento Regional na Universidade do Contestado (UNC).