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Mad Max e a participação feminina na política

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O cinema de ação foi (ainda é, com louváveis exceções) sempre um produto masculino. Testosterona, armas, explosões, mortes sem sentido, aquela violência gostosa que o machinho costuma gostar. Mas vamos passear por uma exceção, para falar sobre política.

 

O mundo masculino é extremamente autocentrado. Quase tudo, para os homens, gira em torno de si mesmos (ou dos seus próprios instrumentos, se preferirem). Teve até uma filósofa americana que disse que o padrão para os homens é usar as mulheres apenas para o sexo, enquanto a admiração, o respeito, a devoção são reservadas a outros homens.

 

E o cinema de ação é o maior sintoma, ao mesmo tempo que é também a maior propaganda disso. Digo isso no sentido de que ele reforça e ao mesmo tempo cativa novos adeptos a este pensamento completamente acrítico de masculinidade. E como o nosso mundo esteve sempre ou quase sempre governado por homens, isso não foi exatamente um problema, havia ordem e paz no cinema de ação. A ordem de sempre e a paz de não perturbar a glorificação masculina.

 

Mas esta paz foi absolutamente conturbada quando George Miller, cineasta australiano, resolveu dar uma sequência com ares de remake à trilogia Mad Max (anteriormente estrelada por Mel Gibson), um dos maiores clássicos do cinema de ação. Mad Max: Fury Road foi lançado em maio de 2015, aqui no Brasil, e fez uma grande parcela dos homens que cultuam homens chorar de raiva. (Mas eles não vão assumir que choraram.)

 

E a reação não poderia ser mais sintomática, no caso. Muitos influenciadores da direita brasileira estavam em completo choque com o fato de que, apesar de o filme ser sobre a personagem (masculino) Max Rockatanski (Tom Hardy na versão atual), quem desenrola com maestria os problemas do filme, eventualmente liderando o enredo, é a personagem Furiosa, interpretada lindamente por Charlize Theron.

 

O filme se passa em um cenário pós apocalíptico, onde a sociedade teria sido destruída por armas atômicas em razão de guerras por petróleo. No que sobrou da civilização, vemos três grandes grupos: uma cidade cuja produção é de água (bombeada do subsolo); outra cuja produção é gasolina e uma que chama “Fazenda de Balas”. Nesta realidade, ergue-se uma espécie de culto em louvor de armas, carros e guerra.

 

Parece masculino o suficiente pra um filme de ação, com certeza. Até que Furiosa (Charlize Theron) resolve dar liberdade a algumas propriedades do grande vilão (Immortan Joe): suas mulheres “parideiras”.

 

O filme é lindo, tremendamente lindo, e merece ser visto ainda hoje, cinco anos após seu lançamento. Mas vamos nos deter em uma questão que foi central na sua recepção: personagens femininas fortes e a cooperação. Na época do lançamento, diversos influenciadores e muito do público masculino se comportaram justamente como as hordas que defendem Immortan Joe no filme: como selvagens semi-civilizados, defendendo a única realidade que conhecem: guerra, violência, morte e propriedade (no caso do filme, a propriedade das esposas e filhos).

 

Os homens do filme, como os homens reais, estavam e estão dispostos a ir à guerra se preciso, contanto que isso garanta seu direito sagrado de reinar sobre quaisquer grupos que estes mesmos homens vejam como propriedade, como as esposas do filme.

 

Constantemente temos mulheres mais do que prontas a exercer o protagonismo na sociedade, e não são poucos os exemplos de mulheres cujo papel social foi revolucionário, visionário e de liderança. Mas ainda assim, não apenas elas são minoria em espaços de poder, mas sempre que o são, seu poder parece ser muito mais questionado e escrutinado.

 

Tomando o maior partido de Canoinhas a título de exemplo, de 11 membros de sua executiva, há apenas duas mulheres, e há de se questionar ainda se não representam justamente as setoriais femininas. Na composição das câmaras de vereadores aqui da região, a cena se repete. Três Barras possui 11 vereadores, sendo 8 homens e apenas 3 mulheres. Canoinhas possui 10 vereadores, sendo 6 homens e 4 mulheres. Mesmo que elas sejam maioria na população do país (e mesmo local, ainda que a diferença seja pouca).

 

No campo do executivo, então, a diferença de presença entre os gêneros é abissal. Por exemplo, você, leitor eleitor, qual a última candidatura feminina que te empolgou? Tá difícil?

 

O campo da política é claramente um reflexo do campo dos filmes de ação. Majoritariamente dominado por homens desde o seu nascimento, e reacionariamente avesso à ascenção feminina, cegamente dominados pelo medo de perder suas propriedades, ou perder seu status de proprietários.

 

Estivemos, os homens, desde sempre nos mais altos postos e com o mais absoluto controle sobre os caminhos da sociedade e dos filmes de ação. Utilizamos todo nosso estoque de testosterona, músculos, armas e munições possível. E o resultado que entregamos tem sido também um futuro pós-apocalíptico de desigualdade, violência, opressão e morte.

 

O grande drama da recepção de Mad Max parece ter sido justamente o fato de que Max e Furiosa (assim como as outras mulheres – absolutamente essenciais à trama) cooperam em sua tentativa de resolver o problema do roteiro. Cooperam e ajudam-se como irmãos humanos em uma terra desolada, sem que seu gênero faça absolutamente qualquer diferença.

 

Ao cabo do filme – vou me permitir o spoiler, porque é central para o texto e não para o filme – Max e Nux ocultam-se. Ambos compreendem que seus papéis estão já encerrados, e que é hora de uma condução diferente. Cada um tem um fim absolutamente justo à sua própria maneira.

 

É preciso compreender que os avanços na igualdade de gênero são fruto de uma luta incessante das mulheres da nossa história. E que avançaremos muito mais rápido neste sentido se cooperarmos, nós, homens.

 

Já era tempo de se ter percebido que músculos, testosterona, armas e munição não resolvem tudo. Assim como meia dúzia de homens não pode representar todo o campo político de uma nação. Neste sentido, a desigualdade de gênero têm inclusive trazido retrocessos a diversas políticas de tratamento às mulheres, o que já não se deveria nem sequer cogitar, em pleno século XXI.

 

Precisamos, homens, ocultar-nos novamente na multidão e dela fazer parte, abdicando do individualismo masculinista que nos trouxe até aqui. Não apenas já não podemos glorificar a exploração e a opressão feminina, temos de nos somar a esta luta, pela emancipação, libertação e participação de todos na nossa vida política.

Equipe Gazeta
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