No Planalto Norte Catarinense, a diversidade histórica e cultural se mescla com a disponibilidade de bens naturais. Nesta direção, emergem relações e interconexões entre passado, presente e natureza. Este artigo tem o objetivo de destacar a relevância da preservação dos recursos naturais, incluindo os solos, as águas, a fauna e a flora, bem como, dos aspectos histórico-culturais, que, de certa forma, moldam ou conformam a identidade regional.
Neste cenário, a história, o povo e sua cultura e os recursos naturais ainda disponíveis, se erguem como pilares fundamentais que podem contribuir para o desenvolvimento regional. Este desenvolvimento não deve ser apenas compreendido como crescimento econômico, mas, sobretudo, como cuidado zeloso com os recursos naturais e o bem-estar humano e animal, refletindo o compromisso com a sustentabilidade e a preservação do ambiente natural e das tradições histórico-culturais regionais.
O desafio de proteger esses legados contra os intensos, desenfreados e nem sempre positivos avanços econômicos, que geram impactos negativos na vida das pessoas e os passivos ambientais, contudo, é tarefa complexa, que exige compreensões dos interesses em jogo para posteriores análises, sugestões e proposições, inclusive, jurídicas.
A Região do Planalto Norte Catarinense é conhecida, também, pela conturbada Guerra do Contestado (1912 – 1916), ainda muito presente nas pessoas que vivem nesse território. Por outro lado, quanto aos aspectos físicos naturais e geográficos, apresentam paisagens vegetais diferenciadas e que fazem parte da Mata Atlântica e dos fragmentos da Floresta Ombrófila Mista (FOM), bons solos, excelentes regimes de precipitação pluviométrica, além de nascentes, rios, banhados e riachos que fortalecem as peculiaridades das características hídricas regionais. Ao transitar pela região, percebe-se as intensas intervenções humanas ocorridas ao longo do tempo e no espaço, as quais são testemunhas de mais de um século de interação entre o homem e a natureza. Além disso, é uma região em que se observa traços diferenciados nas comunidades locais, seja na arquitetura, nas práticas culturais específicas e conhecimentos tradicionais, os quais fazem parte e são guardiões do legado que moldou as identidades regionais.
No entanto, à medida que há maiores intervenções humanas no ambiente, por meio da pressão sobre esses bens naturais, ocorre o processo de descaracterização ambiental. O crescimento econômico, muitas vezes, é visto como antagônico à conservação, gerando conflitos entre os interesses comerciais e a preservação do patrimônio regional. Aqui é onde o conhecimento, especialmente o jurídico, pode desempenhar papel crucial e contribuir no processo de regular a intervenção humana sobre o ambiente.
As tragédias ambientais que estão ocorrendo no Estado do Rio Grande do Sul não são isoladas, mas, amplas e complexas, que afetam não somente aquela região, mas todo o país. O afrouxamento das políticas públicas e das legislações ambientais e a negligência do Estado na proteção dos ecossistemas têm contribuído para a intensificação e agravamento desses desastres naturais. É imperativo, portanto, que reconheçamos a urgência da situação e atuemos de forma proativa, para evitarmos que eventos semelhantes se repitam em outras partes do Brasil, incluindo o Planalto Norte Catarinense.
Ao promover políticas públicas de conservação ambiental mais rigorosas, fortalecer os órgãos de fiscalização e conscientizar a população sobre a importância da preservação dos recursos naturais, pode-se minimizar os riscos de desastres e proteger os aspectos físicos naturais e culturais do país. A proteção do ambiente não é uma questão de escolha ou de capricho, mas, sim, de responsabilidade política que se deve ter com as gerações presentes e futuras.
No Planalto Norte Catarinense, onde a natureza física se entrelaça com a riqueza cultural da região, emergem movimentos que visam o enaltecimento para a importância de cuidar do meio ambiente e para que este seja equilibrado. Nesse contexto, o Artigo 225 da Constituição Federal do Brasil ressoa como um farol, iluminando o caminho para a necessidade de preservação e de respeito à nossa herança natural e cultural. Esse artigo estabelece o direito de todos a terem um meio ambiente ecologicamente equilibrado, reconhecendo-o como um bem essencial à qualidade de vida e à dignidade humana. Além disso, impõe, tanto ao poder público quanto à coletividade, o dever de defender e preservar esse patrimônio para as presentes e futuras gerações. Ao abordar os aspectos físicos, naturais e culturais do Planalto Norte Catarinense, é imperativo lembrar que a proteção ambiental não é apenas uma obrigação legal, como já citado, mas, também, uma responsabilidade moral e ética que compartilhamos como cidadãos e guardiões deste magnífico legado.
O que se quer chamar a atenção do leitor é para o fato de que, contrariamente a algumas percepções comuns, as leis ambientais e culturais não são ou não podem ser vistas como obstáculos ao progresso e ao bem-viver das pessoas, mas, atuam como agentes para salvaguardar e proteger o que é realmente significativo. Ao estabelecer disposições para o uso responsável da terra, promover a conservação dos ecossistemas frágeis e respeitar o valor intrínseco das práticas culturais regionais, o Direito pode ser um aliado ou um instrumento poderoso na preservação da herança ambiental territorial e da identidade cultural.
Os desafios, no entanto, não se limitam às enchentes que estão acontecendo no Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, ou à destruição sem precedentes com o desmatamento do cerrado brasileiro, mas, também, ao abastecimento de água para as comunidades que dependem desses recursos naturais. O desmatamento indiscriminado e o uso excessivo de agrotóxicos estão alterando o ciclo hidrológico da região, reduzindo a quantidade e a qualidade da água dos rios, comprometendo a saúde das populações humanas e animais.
É fundamental, neste sentido, que todo ser humano reconheça a seriedade da situação, atuando proativamente, para evitar desastres em outras partes do Brasil. Não estamos lidando com uma questão de “se” os desastres ocorrerem, mas, sim, de “quando” irão acontecer; portanto, é imperativo agirmos agora, para a prevenção de danos futuros.
Diante desse cenário preocupante, é urgente a adoção de medidas para frear o desmatamento e a promoção e instituição de práticas ambientais mais sustentáveis, dentre outras. Isso requer um esforço conjunto do governo, dos setores agrícola, pecuário, industrial e comercial, e da sociedade civil, com a adoção de políticas públicas eficazes, o estabelecimento de áreas protegidas e o incentivo à agricultura familiar, agroecológica e regenerativa. Dessa forma, poderemos dar início ao processo de restauração e preservação dos solos, rios e outros bens naturais, na perspectiva da sustentabilidade dos recursos naturais para as gerações presentes e futuras.
Nesta direção, a proteção legal dos bens naturais e culturais do Planalto Norte Catarinense pode contribuir para manter a sobrevivência das comunidades locais e, consequentemente, promover a sustentabilidade. O progresso não pode ser medido apenas em um prazo curto ou por meio dos indicativos economicistas (lucros imediatos e outros), mas, sim, pela capacidade de oferecer qualidade ambiental e de vida para as pessoas. Ao proteger os bens naturais e culturais do Planalto Norte Catarinense, mediante uma abordagem legal constituída, está-se investindo na resiliência das comunidades locais e na saúde do meio ambiente.
Além disso, a proteção legal desses bens pode gerar oportunidades para o desenvolvimento de outras ou de novas atividades econômicas sustentáveis que valorizam e preservam os recursos naturais e culturais regionais, como turismo ecológico, agricultura orgânica sustentável, artesanato local e outras iniciativas, que podem prosperar se apoiadas por regulamentações que priorizam a conservação e a sustentabilidade.
Ao mesmo tempo, a preservação da herança territorial e identidade cultural do Planalto Norte pode promover um crescente senso de pertencimento e orgulho nas comunidades locais. Ao reconhecer e valorizar suas tradições e recursos naturais, as pessoas tendem a fortalecer as concepções e práticas de pertencimento, se sentirem mais conectadas à sua terra e mais motivadas a protegê-la para as gerações futuras.
Assim sendo, a proteção legal dos bens naturais e culturais do Planalto Norte Catarinense não é apenas uma questão jurídica ou de conformidade legal, mas, sim, um compromisso político com a construção de um futuro mais sustentável, inclusivo e duradouro. Ao reconhecer o valor intrínseco desses recursos e promover sua preservação, está-se gerando as bases para um desenvolvimento duradouro, que respeita tanto as necessidades do presente quanto as oportunidades do futuro.
Autores:
Manuela Pozza Ellwanger – Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado (UNC). E-mail: [email protected]
Jairo Marchesan – Docente do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional (PPGDR) e do Programa de Mestrado Profissional em Engenharia Civil, Sanitária e Ambiental (PMPECSA) da Universidade do Contestado (UNC). E-mail: [email protected]