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O DIREITO À PAZ PÚBLICA E OS PRISMAS SOBRE A POLUIÇÃO SONORA

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Micael Eduardo Bonfim¹

 

O som nos acompanha desde nossa concepção, sendo essencial para a comunicação e importante instrumento das relações sociais. Todavia, este em muitos momentos da história tornou-se incômodo a muitas pessoas, inclusive, a título de curiosidade, na Roma Antiga, quando se teve a proibição de circulação de carroças na metrópole durante o período noturno, com a finalidade de garantir, equalitariamente, o sossego.

 

 

Um tema complexo na seara jurídica, e que reflete diretamente na vida do cidadão. Nesta temática, a Lei nº 6.938/81 nos dá uma breve definição de poluição, amplamente: “poluição” é a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente, prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar da população, criem condições adversas às atividades sociais e econômicas, afete desfavoravelmente a biota, as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente ou lancem matérias ou energias em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.

 

 

Na última lauda do artigo, apresenta-se especificamente, o que conhecemos como poluição sonora, sendo em sentido lato a provocação através de elevado nível ruidoso em local determinado. E eis que surge à questão da aferição destes números, para observar se os dados estão de acordo com a legislação ambiental vigente. Geralmente, os limites interpostos de emissão estão previstos nas Resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), sendo que qualquer violação a estes números é considerada ilegal, ou seja, prejudicial à saúde humana.

 

 

Afirma Bondarenco Zajarkiewicch (2011, p. 14) que “diferentemente da degradação causada pelos resíduos sólidos, líquidos e gasosos oriundos da industrialização, que atingiam indiretamente o ser humano através da degradação dos recursos naturais, (…) o ruído atingiu o homem diretamente.” Confirma que “como a perda auditiva, geralmente, se dá de forma cumulativa no tempo, perceptível quando o prejuízo auditivo já está presente, o ruído se transformou na sociedade pós-revolução industrial, num inimigo visível”.

 

 

Com o advento da Lei 9.605/98, a poluição sonora englobaria um artigo específico nesta tipificação penal, a qual previa em seu artigo 59: “Produzir sons, ruídos ou vibrações em desacordo com as prescrições legais ou regulamentares, ou desrespeitando as normas sobre emissão e imissão de ruídos e vibrações resultantes de quaisquer atividades: Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa”. Porém o dito artigo foi vetado através de decisão do presidente da República, pela inconstitucionalidade do mesmo perante a Lei das Contravenções Penais, Decreto-Lei n° 3.688, de 3 de outubro de 1941, que já previa tipificação específica no artigo 42, apontando a perturbação do trabalho e sossego alheio como conduta desidiosa.

 

Até hoje, não há no Brasil lei que trate especificamente da poluição sonora além do supracitado Decreto-Lei, todavia, tramitam no Congresso Nacional, dois projetos de lei, sendo o 263/2007 e 1024/03, que tendem a suprir esta omissão legislativa.

 

 

Conforme leciona SIRVINSKAS (p. 158), “uma pesquisa realizada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) constatou que o Brasil será o país dos surdos, tendo em vista a intensidade dos ruídos produzidos, principalmente nos grandes centros urbanos.” O que somente confirma a importância desta pauta e sua conscientização hodierna.

 

 

Similarmente, FRANCO (p. 16) nos adverte que “o jurista no âmbito do Direito do Ambiente não vai muito longe sozinho, não vai muito longe se se fechar no Direito, se não abrir essas janelas do conhecimento a outros ramos do saber, a técnica, a engenharia, etc. se não souber trabalhar em conjunto com os demais”. Com isto, ressalta-se a importância do laudo técnico elaborado por profissional habilitado, que obrigatoriamente deve ser juntado aos autos num eventual procedimento criminal e que preliminarmente pode realizar um acompanhamento da emissão de ruídos de determinado estabelecimento, casas de show, por exemplo.

 

 

A NBR 10.151, “Avaliação do ruído em áreas habitadas visando o conforto da comunidade”, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), é a responsável legal, que estabelece os níveis previstos pela Resolução CONAMA nº 01/90, sendo qualquer variação nestes números, resta configurada a dita poluição sonora.

 

 

Na esfera penal, como nos mostra as jurisprudências, o Estado pode tornar-se poluidor indireto, quando adota conduta omissiva, para fazer cessar ou não utilizar seu poder de polícia. Cabe ressaltar que primeiramente, compete ao Município enquanto administração pública, o dever de averiguar eventuais casos como os expostos, quando se tratar de emissão de ruídos em desacordo com o previsto na Legislação. Caso que comprova esta posição, é a Apelação Cível nº 269698-8 da 2ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba e as várias ações judiciais contra o município de Santa Cruz do Sul (RS), como nos mostra, sua omissão constitucional de seu dever de proteção ambiental.

 

 

As divergentes situações sub judice recebem conotações jurídicas diversas, dependendo da comarca em que esta esteja situada. Em alguns casos esta é tratada como contravenção penal, como incômodo de cunho individual e subjetivo, em outros leva o aspecto de direito de vizinhança, sendo o barulho discutido na esfera cível em relação a ressarcimento por danos morais e ainda em outras, recebe conotação coletiva, a tratando sim, como mais uma hipótese de poluição ambiental.

 

 

Outro ponto que merece destaque está na relação do direito ao lazer e a paz pública, o qual está salvaguardado através dos diplomas legais vigentes, que regulamenta tais direitos na Lei nº 3.688 de 1941, ou Lei de Contravenções Penais. Neste prisma, BORGUEZAN e GREIN JR (2015, p. 163) citam que tão somente a Polícia Militar de Canoinhas/SC em 2012, através dos dados da Central de operações, recebeu aproximadamente 693 ligações referentes a perturbação do sossego alheio, das quais 46 geraram termo circunstanciado.

 

 

Neste ponto é que se faz mister expor a poluição sonora tipificada como contravenção penal, ou seja um crime de gravidade minorada. O difícil nestes casos, tendo em vista os empecilhos legais citados acima é sua configuração e a crescente onda nos casos desta categoria nos municípios Brasil afora, e também escassez de material para que os Agentes de Segurança Pública, façam valer o que reza a legislação nacional, seja a falta de pessoal e até mesmo, do aparelho medidor, o decibelímetro.

 

 

A Organização Mundial de Saúde (OMS) atribuiu a poluição sonora em conjunto à poluição atmosférica e hídrica, o conceito de prioridade ecológica, o que por óbvio é importante para o futuro, todavia sem a definição correta por parte dos órgãos estatais, nada disso pode se concretizar. Sem dúvida, são necessários instrumentos eficazes a fim de educar, controlar e gerir esta problemática, em viés multidisciplinar, aprimorar a tutela jurídica futura, em relação aos óbices encontrados nas tramitações e seus aspectos jurídicos e técnicos.

 

 

Referências

 

BONDARENCO ZAJARKIEWICCH, D. F. Poluição Sonora Urbana: principais fontes. Aspectos jurídicos e técnicos. (Tese de Mestrado) PUC/SP. 2011.

BORGUEZAN, Danielly. GREIN JUNIOR, José. In Crônicas do Desenvolvimento III; perspectivas filosóficas e sociológicas / Sandro Bazzanella, Walter Knaesel Birkner, Danielly Borguezan, Felipe Onisto (organizadores) – São Paulo: LiberArs, 2015.

FRANCO apud ARAUJO, G. M. REGAZZI, R. D. Perícia e Avaliação de Ruído e Calor passo a passo – Teoria e Prática. Rio de Janeiro, s/n, 2002

SIRVINKAS, L. P. Manual de Direito Ambiental. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

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